Jovem usa arte drag como ‘válvula de escape’ para enfrentar a ansiedade


Fernando Cassimiro, estudante do 5º período de engenharia química da Ufal, dá vida à drag queen “Foxes”. No mês da campanha Setembro Amarelo, g1 AL traz série de reportagens sobre a saúde mental. Estudante realiza performances em boates de Maceió montado como drag queen Foxes
Arquivo pessoal
A psiquiatra alagoana Nise da Silveira (1905-1999) utilizava a arte como ferramenta para o tratamento de seus pacientes. O método que revolucionou a psiquiatria no Brasil também traz conforto ao universitário Fernando Cassimiro, 25. Diagnosticado com Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG), ele diz que a arte drag é sua válvula de escape para expressar sentimentos e ressignificar angústias.
Clique aqui para se inscrever e receber no seu WhatsApp as notícias do g1 📲
“Quando estou montado de drag queen, como Foxes, os problemas que o Fernando carrega desaparecem. Torna-se uma válvula de escape. É a construção de outra persona, onde recupero minha paz e me sinto vivo novamente”, afirmou o universitário.
No mês da campanha Setembro Amarelo, criada para a prevenção ao suicídio e promoção dos cuidados com a saúde mental, o g1 AL publica uma série de reportagens sobre pessoas que enfrentaram ou ainda enfrentam episódios traumáticas, mas que conseguiram se recuperar com ajuda profissional e apoio psicológico.
O estudante de engenharia química da Universidade Federal de Alagoas (UFAL) está no 5º período da graduação, metade do curso, mas já deveria estar próximo da colação de grau, se não fosse a instabilidade emocional que o fez pensar em desistir algumas vezes. Por causa da suspensão da bolsa de pesquisa que recebia, precisou voltar a trabalhar.
“Meu curso é integral. Por muito tempo, estive em uma linha tênue entre estudar ou trabalhar. Tentei fazer as duas coisas ao mesmo tempo por dois anos, e isso atrasou bastante a minha vida acadêmica, além dos problemas psicológicos que me trouxe. Preciso trabalhar para pagar aluguel e manter minha arte viva. No meio disso tudo, perdi algumas matérias, por falta de tempo ou dificuldade para estudar”, disse Fernando Cassimiro.
Atualmente, Fernando faz “bicos” como garçom, monitor de festa infantil e se apresenta em boates da capital alagoana com a drag queen criada em 2019, Foxes. Em meio a tantas atividades para conseguir se manter financeiramente, o desempenho na faculdade acaba sendo prejudicado, mas ele diz que largar os estudos não é uma opção.
“Vejo as pessoas se encaminhando no curso, e eu não consigo acompanhar. Isso me deixa com a autoestima péssima, gera muita crise de ansiedade. É uma luta constante para conseguir saúde mental e estar ali. Eu sonhei muito com esse curso e não quero desistir. Eu quero me formar, mudar minha vida e da minha família”, contou.
LEIA MAIS DA SÉRIE:
Professora supera depressão após a perda de dois filhos e do divórcio
Jovem conta como lida com o peso das responsabilidades da vida adulta
Mestranda relata tratamento da ansiedade em meio à pressão da vida acadêmica
Alagoana busca rede de apoio para tratar depressão em São Paulo: ‘A vida é muito solitária’
Universitário Fernando Cassimiro também trabalha como DJ em festas em boates de Maceió
Arquivo pessoal
E até a arte que é sua válvula de escape também tem suas dificuldades, sobretudo quando se trata de relacionamentos pessoais e oportunidades de trabalho em Maceió.
“Está longe de ser mil maravilhas, principalmente quando falo da minha sexualidade e dos meus relacionamentos interpessoais. Algumas pessoas, inclusive da própria comunidade LGBT, de onde esperamos a maior parcela de apoio, ainda têm um certo preconceito com nossa arte”, afirmou.
Preconceito, perigo noturno e apoio da família
De acordo com levantamento do Grupo Gay da Bahia (GGB), Alagoas registrou 10 mortes de pessoas LGBTQIAPN+ em 2022. No mesmo ano, em todo o país, 256 pessoas da comunidade foram assassinadas ou cometeram suicídio.
Fernando Cassimiro avalia que a família pode ser o principal alicerce para evitar que histórias difíceis se tornem tragédias. Ele conta que sempre recebeu carinho e apoio dentro de casa, desde quando assumiu sua orientação sexual e desde que sua personagem drag nasceu.
Contudo, por conta dos perigos noturnos, também precisou criar uma rede de apoio fora de casa. “Eu e algumas amigas não voltamos para casa sozinhos. Morremos de medo. Sempre rachamos a conta em algum aplicativo de viagem. Além do medo de sofrer preconceito, tem motoristas que assediam e muitas vezes até nos tratam como garotas de programa”.
LEIA TAMBÉM:
A história esquecida das drag queens e kings do passado
Mesmo com toda dificuldade, Fernando segue em frente, usando da sua arte como um canal para transmitir mensagens de apoio e manifestar seus sentimentos.
“É muito importante não abrirmos mão dos nossos sonhos e desejos por causa de ninguém. Se é algo que nos faz bem e não fere os outros, não devemos nos preocupar. Estou a cada dia evoluindo, aprendendo e entusiasmado para me expressar cada vez mais e fazer com que minha arte alcance muitas pessoas”, disse o estudante.
Fernando criou a persona Foxes para fortalecimento da arte drag em Alagoas, mas isso acabou servindo como escape para a sua ansiedade
Arquivo pessoal
Prevenção ao suicídio
A campanha “Setembro Amarelo” é uma iniciativa do Centro de Valorização da Vida (CVV), da Associação Brasileira de Psiquiatria e do Conselho Federal de Medicina. O CVV faz um apoio emocional e preventivo do suicídio pelo número 188.
Na rede pública, a indicação é procurar os Centros de Apoio Psicossocial (CAPS) do Sistema Único de Saúde (SUS). Por lá, é possível marcar uma consulta com um psiquiatra ou psicólogo.
VÍDEO: Recitando cordel, psicólogo alerta para a importância dos cuidados com a saúde mental
Recitando cordel, psicólogo alerta para a importância dos cuidados com a saúde mental
Confira mais notícias da região no g1 AL

Bookmark the permalink.